segunda-feira, 29 de agosto de 2011

REMANDO POR CAMPOS E FLORESTAS

quantas vezes a gente reclamava e pedia um livro como este. Ele está feito! Graças à Superintendência do IPHAN no Pará, graças aos organizadores professores Denise Shaan, Agenor Sarraf e Jane Beltrão da UFPA e, sobretudo, aos professores da rede escolar pública no Marajó no convívio diário com a comunidade. 

Agora a bola passa para a dita cuja comunidade, com suas lideranças sociais, políticas e empresariais. Muito justamente, a gente dizia SEM EDUCAÇÃO NÃO TEM SOLUÇÃO... Mas, educação pra quem e pra quê, cara pálida? Marajó sempre teve uma elite bem letrada, educada na capital e doutorada no exterior., que deu governadores, deputados, senadores e atraiu muitos amigos intelectuais... O que faltava era dividir os frutos da Educação com o povo. Vai que é sua, gente boa!

 
POR CAMPOS E FLORESTAS




















IPHAN LANÇA PRIMEIRO LIVRO DIDÁTICO SOBRE ARQUEOLOGIA E

PATRIMÔNIO CULTURAL “DOS MARAJÓS”

O livro “Remando por Campos e Florestas: Memórias & Paisagens dos
Marajós”, organizado pelos professores doutores da Universidade Federal do
Pará, Denise Pahl Schaan, Agenor Sarraf Pacheco e Jane Felipe Beltrão, será
lançado na segunda-feira, dia 29 de agosto de 2011, às 19h30 no IPHAN.
Patrocinado pelo CNPq e IPHAN, o livro “Remando por Campos e Florestas, é
resultado do Projeto Popularização do conhecimento sobre a história e a
arqueologia da ilha de Marajó, cujo objetivo é levar à população do Marajó dos
Campos e do Marajó das Florestas, conforme denomina o historiador Agenor
Sarraf, por intermédio do público escolar, o conhecimento sobre a História e a
Arqueologia do lugar onde vivem, assim como sobre os processos de construção
do conhecimento inerentes às atividades de arqueólogos, historiadores e
antropólogos, despertando vocações científicas, incentivando a valorização de
seu patrimônio cultural e sensibilizando as comunidades para a necessidade de
sua proteção e preservação.
 

O projeto foi desenvolvido em três etapas, durante os anos de 2008 e 2009 e
contou com a participação de 24 professores marajoaras. A primeira etapa
constitui-se em um curso de Educação Continuada para Professores
Pesquisadores, ministrado nos pólos de Breves e Soure e foi conduzida pelas
professoras doutoras Denise Schaan, Jane Beltrão, Márcia Bezerra e Rosa
Acevedo e os professores doutores Agenor Sarraf, Fernando Marques, Hilton da
Silva e Flávio Silveira. Na segunda etapa, os professores de posse de orientações
sobre pesquisa local e trabalhos com narrativas orais, realizaram investigações
procurando registrar por meio de entrevistas, desenhos e trabalhos didáticos
com seus alunos, memórias de artefatos arqueológicos, bens públicos, histórias
de viveres, saberes e fazeres de sua localidade. 


Ainda nessa segunda etapa, o professor Agenor Sarraf viajou para alguns municípios com a finalidade de acompanhar e orientar o desenvolvimento da pesquisa, visando à organização do
material coletado para ser utilizado na terceira fase. Na última fase, ocorrida em
Belém, numa Oficina de Produção Textual, os professores confeccionaram seus
textos, explorando o conteúdo oral, escrito e visual da pesquisa, além de
apresentarem um roteiro de atividades como sugestão de caminhos e
possibilidades para professores e alunos explorarem o material confeccionado
em sala de aula.


A obra é o primeiro livro didático sobre o patrimônio cultural da região
marajoara, destinado ao Ensino Fundamental, especialmente 5ª a 8ª série, hoje 6º
ao 9º ano, e está organizada nos seguintes eixos temáticos: paisagens &
passagens, histórias de vilas e cidades, patrimônio material e imaterial e
narrativas fantásticas. São 22 textos produzidos por professores de escolas
públicas marajoaras, destacando-se especialmente os municípios de Melgaço,
Portel, Anajás, Ponta de Pedras, Muaná, Chaves, Cachoeira do Arari e Salvaterra.
O livro será distribuído para todos os autores e secretarias municipais de
educação do arquipélago, assim como já está disponível para download no site
http://www.marajoara.com. Espera-se que com essa iniciativa, possamos
ampliar o conhecimento sobre a arqueologia, a história e o patrimônio cultural
marajoara e criar novos mecanismos de difusão dessa riqueza de saberes que
pulsam nesse lado da Amazônia brasileira.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

TEMPO PARA HISTÓRIA

Morre Bispo emérito de Ponta de Pedras

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No último dia 20(sábado) de agosto, na Itália, morreu o bispo emérito de Ponta de Pedras (PA) Dom Ângelo Maria Rivato, 87 anos, devido a complicações causadas por um Acidente Vascular Cerebral (AVC). O Instituto Federal do Pará que possui o Polo Avançado de Ponta de Pedras se solidariza com a família, amigos e todos os que acompanharam a vida de Dom Ângelo.

A missa de 7° Dia de seu falecimento será realizada às 6h30 do dia 26/08, em Belém, na Capela de Nossa Senhora de Lourdes, que fica localizada na Av. Gov. José Malcher, quase esquina com a Av. Generalíssimo. Também na cidade de Ponta de Pedras, na Igreja Matriz da cidade, às 19 horas do mesmo dia.
O bispo emérito de Ponta de Pedras teve seu ministério durante 35 anos nas terras amazônicas. De 1967 a 2002 foi o primeiro bispo prelado de Ponta de Pedra. No ano de 2009, após decisão da Congregação Companhia de Jesus, a qual fazia parte, Dom Ângelo foi residir em Gallarate, Itália.




Renata Paes
ASCOM - REITORIA

É claro que sou um caboco um tanco quanto diferente dos meus parentes. Por necessidade e acaso, me tornei estoriador quando queria aprender escrever romance e o íma da História me arrastou a outras paragens. Meu relacionamento com o imperioso e ao mesmo tempo afetuoso Angelo Maria Rivatto daria matéria para romance interessante: faltou-me talento... Devo tentar algum dia dar testemunho sobre tal personalidade complexa. Há muita coisa que um verdadeiro historiador deveria pesquisar sobre a história dos jesuítas no Marajó. E pelo que parece o historiador Agenor Sarraf estaria inclinado a encarar a questão.

Nesta oportunidade, quero apenas lembrar que no dia 25 de julho de 1995, assisti missa campal celebrada pelo bispo Angelo Rivatto S.J. na agrovila "Antônio Vieira", município de Ponta de Pedras. Na homilia ele afirmou ter sido naquele lugar que, nos idos do século XVII, o Padre Antônio Vieira tinha realizado a célebre pacificação da ilha do Marajó em acordo com sete caciques. Eu, confesso, apesar do vício da leitura nunca houvera lido ou ouvido falar nada a respeito do assunto...

A curiosidade me assaltou e mal esperei acabar a missa para perguntar a fonte e ele, sempre escapando, respondeu de repente, "está no livro do padre Serafim Leite". Bastou... É a "História da Companhia de Jesus no Brasil", 4 tomos maçudos pejados de notas. 

Logo vi, Dom Angelo não era homem de perder tempo com leituras complicadas, parecia mais um ativista templário: ele estava redondamente enganado, nunca o Padre Antônio Vieira havia posto os pés na praia da Mangabeira ou no sítio Pau Grande, que o bispo emérito de Ponta de Pedras teve cuidado de trocar para, justamente, "Antônio Vieira". Entretanto, por capricho da história aquele povoado fora antes o Lugar de Vilar (segundo o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira), que na reforma toponímica do estado do Grão-Pará e Maranhão determinada pelo Marquês de Pombal em função da expulsão dos jesuítas, substituiu a antiga aldeia de índios "Guaianazes" [Guaianá, deve grafar conforme a convenção moderna].

Aí está a graça da coisa: que os Guaianá foram um dos sete povos citados pelo Padre Antônio Vieira, em longa carta enviada à regente de Portugal, Dona Luísa de Gusmão; dando conta da missão do Pará até fins do ano de 1659; que na confederação dos Nheengaíbas [etnias nuaruaques do Marajó] celebraram as pazes com os portugueses do Pará, num encontro incrível - desdenhado pelos historiadores, mas pelo menos poetas e romancistas ficam a dever - que deu termo à guerra suja (1623-1647) para expulsão dos Hereges (protestantes) holandeses e ingleses do estuário amazônico.

 O verdadeiro lugar que Dom Angelo buscava e não encontrou por que não leu todo palimpsesto do historiador da Companhia de Jesus no Brasil, ou leu mas não quis dizer; fica no município de Breves, mais precisamente no "rio dos Mapuaises" [Mapuá], que hoje é, por acaso, a Reserva Extrativista Florestal Mapuá (Resex Mapuá).

Numa conversa compartilhada com Ercílio Marinho, disse-nos o bispo de Ponta de Pedras que havia tão-só por líderes Jesus Cristo e Dom Helder Câmara... Ele ficou conhecido na diocese por seu temperamento autoritário e a companhia constante de sua colaboradora pessoal Nella Remella: ambos tentaram realizar uma singular obra de feição kibutziana. As famosas "cooperativas da Nella" como o povo local dizia. Para mim, um caso de sucesso social em "reforma agrária" feita pela Igreja Católica e um fiasco econômico; jamais considerado como deveria ser pela pesquisa acadêmica.

Obrigado, Dom Angelo, pela dica! 

Foi assim que, por acaso, me tornei "especialista" em Vieira... Daí, que, como diria Raul Seixas; "misturando minha maluquez com a minha lucidez" peguei o mito tupi da Terra sem Mal com a utopia evagelizadora do "payaçu dos índios" (sebastianismo do Quinto Império do Mundo) e transformei a triste realidade do Fim do Mundo na alegoria de Vilarana. Não há dúvida de que, apesar da briga entre os irmãos italianos Giovanni Gallo e Angelo Rivato; eles embarcaram seus sonhos na mesma barca da utopia que se chama Civilização.  



sexta-feira, 19 de agosto de 2011

ECONOMIA SOLIDÁRIA DE PONTA EM RESERVAS EXTRATIVISTAS



1.

UM MILHÃO DE AMIGOS QUEREM SALVAR DA AMAZÔNIA [será?]

Enviado por: "Jose Varella" jotazeka@gmail.com                 

Qui, 18 de Ago de 2011 9:39 am

há um mistério misterioso nesse cenário amazônico assombroso:
§ dum lado a turma dos DESENVOLVIMENTISTAS puxam o correntão do corte raso, madeira vem abaixo e haja devastação: quando acaba tal "desenvolvimento" caboco fica na mão, entregue ao bang-bang latifundiário com seus testas de ferro no comércio internacional e na política, diz-que, nacional... §
na contramão, estão os salvadores do verde que te quero verde com santuário ecológico, os protetores de sempre cujos PROTETORADOS em África, Ásia e Oceania deviam deixar quilombolas, índios, cabocos e toda mais humanidade extrativista tradicional de barbas de molho...
no meio do bafafá do INFERNO VERDE versus PARAÍSO ECOLÓGICO os filhos do LIMBO [índios, quilombolas, cabocos, etc e tal] mais perdidos de que cego em meio a tiroteio... Fala sério!
Salvar a Amazônia contra quem, cara pálida? Os predadores históricos que ainda não acabaram de sugar as veias abertas da América Latinas? Os novos capitalistas herdeiros e descendentes dos velho piratas de antigamente?
Era melhor, então, 25 milhões de amazônidas unidos gritar SALVE-SE AMAZÔNIA!!!
Eis que, na verdadeira verdade, o seringueiro Chico Mendes deu o grito de indepenência e morte das populações tradicionais, lá em Xapuri, no Acre! E o grito de Chico reboou até no exterior... Um tiro assassino matou Chico mas não calou a sua voz, reproduzida por mil, um milhão de vozes... Tal qual, Chico Mendes no Nordeste brasileiro mataram Margarida Maria Álves pelo grande "crime" de ser ela professora de homens e mulheres sem terra e querer erradicar a miséria e a fome acando junto o ANALFABETISMO POLÍTICO...
Que perigo enorme, tanto para exploradores do trabalho escravo tanto para biopiratas fantasiados de cavalo verde de Troia com sabe deus quanta tramoia, pra deixar a brava gente brasileira no mato sem cachorro?
Por acaso, Marajó (na Resex Terra Grande - Pracuúba) a 6 de agosto deu-se o encontro das Resex da Amazônia... Ah! Se o grito de Chico, do Acre conquistado pelo gaúcho Plácido de Castro com seus seringueiros do Nordeste enganados pelos bancos e casas aviadoras com os barões da Borracha, fosse traduzido pela PEDAGOGIA AGRÁRIA de Margarida Maria...
Quem dera, Norte e Nordeste povoado de cabra-da-peste partissem firmes para o EMPATE da empulhação da Amazônia! Então, a Resex Mapuá recobraria a memória do 27 de Agosto com a PAZ DOS NHEENGAÍBAS... E a Resex Terra Grande - Pracuúba, vizinha de Muaná, apagaria da estória da "data magna" mentirosa do 15 de agosto; soerguendo em lugar dela o heroísmo de 28 de Maio, quando o Pará por decisão de sua gente aderiu à Independência do Brasil...
Claro, com tantos amigos protetores a querer salvar o meio ambiente, não sobra espaço pra gente "rebelde", que nem nheengaíbas, ajuricabas e cabanos, meus manos!
o negócio é derrubar madeira a preço de banana, ou deixar floresta em pé pra fornecer perfumaria a bacanas que nem na estória do perfume Chanel nº 5, em cuja fórmula "amazônica" entra alienação da mais valia e trabalho escravo dos piores. §
mas, é VERDADE reservas extrativistas e assemelhadas são ou devem ser com URGÊNCIA unidades socioambientais de PRODUÇÃO ecológico-econômica autogestionárias, sem medo de ser feliz e ponta de lança da ECONOMIA SOLIDÁRIA integrada a grandes empresas responsáveis. Por que não? §
VEJA ESTA NOTÍCIA QUE A "GRANDE IMPRENSA" não deu com o destaque ECONÔMICO merecido http://g1.globo.com/platb/natureza-maryallegretti/ -- 

terça-feira, 2 de agosto de 2011

ACORDANDO O GIGANTE DA AMÉRICA DO SOL SOBRE SUA AMAZONIDADE

Não sei se amanhã a ilha do Marajó estará preparada a receber o repatriamento da cerâmica marajoara extraída dos tesos arqueológicos e levada embora desde a primeira notícia (20/11/1756), conforme informa o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, em "Notícia Histórica da Ilha Grande de Joanes, ou Marajó" (Lisboa, 1783), separata da "Viagem Philosophica" (1783-1792); ou se ainda os marajoaras lesados dos 400 anos de invenção da Amazônia hão de esperarmais 50 anos para ver de volta o tesouro que lhe tiraram sem consideração e consentimento.

O que parece certo é que o mundo todo está mudando de atitude imperial por necessidade do chamado "desenvolvimento sustentável". O que implica reconhecer que entre Biodiversidade e Diversidade Cultural não há separação nenhuma: portanto, não há desenvolvimento que não seja humano... E este não se faz sem fundamento economico, como também não existe nada que seja global sem sustento local. A dicotomia "centro" e "periferia" existe apenas no mundo político. A periferia está por todos os centros e há centros na periferia...

O IDH de miséria nas ilhas da Amazônia Marajoara esconde riquezas incalculáveis!... Nada é mais urgente do que elevar a auto-estima desta gente, quebrando a causação circular da pobreza. Não basta só prover um prato de lentilhas para quem foi roubado de sua antiga fortuna. Se amigos das populações tradicionais da Amazônia em todo mundo estão dispostos a abolir a falsa caridade do novo colonialismo, resgatem a antiga Cultura Marajoara e ajudem a gente a restaurá-la com visões de futuro: museus de prestígio internacional (sobretudo aqueles da lista de Denise Schaan, em "Cultura Marajoara", editora SENAC, São Paulo, 2010).

Com raras exceções, os marajoaras mais esclarecidos e os políticos paraenses em geral merecem muitas críticas sobre o estado de ruína a que foi condenada a Cultura. Todavia, mais críticas cabem aos acadêmicos e os políticos brasileiros da Cultura, que não se sensibilizam nem agem para remediar o absurdo.

Adiante, o profundo artigo do doutor Nelson Sanjad, do Museu Paraense Emílio Goeldi; sobre a relação histórica, no século XIX, entre "região" e "nação" lança luz sobre a situação que perdura no campo exterior e no interior do País. Indiretamente, esclarece o drama de Giovanni Gallo com o sui generis o "Nosso Museu do Marajó" (ecomuseu avant la lettre, inventado de "cacos de índio" na vila de pescadores Jenipapo, na beira do lago onde floresceu a primeira cultura complexa da Amazônia; tal qual a desdenhada "ciência de potes quebrados" de Ferreira Penna). E, no limite da disciplina, o purgatório da literatura marajoara de Dalcídio Jurandir...).

Que nos sirva de base a uma reflexão criativa compartilhada, com que enfim a transversalidade da Ciência sirva à Educação, Cultura e ao Turismo com gerador de emprego e renda: com que a Floresta Nacional de Caxiunã e a Estação Científica Ferreira Penna se abram à comunidade marajoara cooperando num esquema federativo com as universidades atuando na região para dotar o Museu do Marajó / Casa de Dalcídio Jurandir de meios para realizar a missão maior que se espera.

O novo Brasil democrático precisa da Amazônia Marajoara renascida! Preparar Marajó para a volta de seu tesouro arqueológico, com os agradecimentos desta gente aos museus nacionais e estrangeiros que, durante o longo período colonial de destruição e exílio; zelaram pela conservação e estudo da primeira civilização autenticamente brasileira. 

leiam as conclusões finais do doutor Nelson Sanjad em seu muito oportuno artigo sobre a área cultural da Guiana Brasileira (Amapá e Baixo-Amazonas):

"Para Ladislau Netto, o acervo do Museu Paraense estava, certamente, entre os mais importantes, em razão do valor atribuído, no século XIX, às urnas e aos crânios de Maracá, ou à cultura marajoara - a única "grande civilização" comprovadamente existente no passado brasileiro. Ladislau Netto não admitia terem os vestígios da Nação outro destino que não os salões do Museu Nacional. Segundo ele, o estudo dos índios era não apenas "a necessidade a mais urgente e a mais alta missão atual", pois estavam prestes a desaparecer, como também Museu Nacional era o "único estabelecimento científico do Brasil em condição de recolher e de estudar os despojos" dos antigos habitantes do território114. Ao se referir às sociedades nativas, o tom fatalista de Ladislau dava, assim, um sentido ao seu empenho em favor das pesquisas antropológicas - e uma missão científica e política ao Museu Nacional.
Tal missão tinha como base as coleções arqueológicas e etnográficas, que serviam para comprovar, ou não, as teorias sobre o povoamento das Américas; e também para criar uma narrativa sobre os povos que contribuíram para formar a nação brasileira115. Aos debates, fossem sobre o autoctonismo ou sobre as rotas migratórias pré-coloniais, somavam-se os problemas do destino, da tutela e da integração dos povos indígenas à sociedade nacional, questões que, a um só tempo, incentivavam a ciência e eram por ela incentivadas - e que tinham como fim a construção do passado e a avaliação das possibilidades de desenvolvimento econômico e social do país116.
Núcleo importante para as discussões científicas do Segundo Reinado - particularmente aquelas que tinham como foco os conceitos de território, natureza, sociedade e história -, o Museu Nacional contava com o apoio da máquina administrativa imperial (incluindo os presidentes das províncias) para fazer convergir para si acervos e recursos financeiros. Nesse sentido, pode ser considerado mais um espaço onde se desenrolavam as tensões entre região e nação, ou seja, entre os projetos ilustrados locais (como os museus e as agremiações), que tentavam consolidar-se em meio a dificuldades políticas e financeiras, e a imagem do Império divulgada pela Coroa por meio de suas agências oficiais, muito melhor aparelhadas e em condições de se expandir. Essas perspectivas nem sempre eram coerentes, nem convergentes, como se pode depreender do dilema profissional de Ferreira Penna: sem apoio do governo local, encontrou suporte para suas investigações no Museu Nacional, embora sua primeira intenção tenha sido desenvolver um museu provincial.
O embate entre o Museu Paraense e o Museu Nacional (incluindo o confisco do acervo do primeiro pelo segundo) e as propostas divergentes elaboradas por Ferreira Penna e por Ladislau Netto para a regulamentação do acesso ao patrimônio arqueológico amazônico mostram que, sob o discurso da "identidade nacional", jazem iniciativas ou movimentos culturais locais fragmentados. Da mesma forma, a apropriação do espólio dos índios marajoaras oscilou segundo as intenções políticas dos que estavam envolvidos no debate: enquanto Ferreira Penna enfatizou (com poucas evidências) que a expressão máxima da "raça primitiva" brasileira ocorrera no Pará - justificando assim a permanência, na província, dos vestígios arqueológicos correspondentes, Ladislau Netto e Lacerda não corroboraram essa tese, limitando-se a distinguir aqueles índios dos que então viviam no país. Em uma escala diferente da de Ferreira Penna, Ladislau via na arqueologia marajoara a possibilidade de dar complexidade à formação social do país, recuando para tempos pré-coloniais a origem da nacionalidade brasileira - enobrecida, em parte, com uma "legítima civilização".
Essas distintas visões demonstram que a arqueologia brasileira do século XIX - então em processo de formação teórica e de quadros profissionais - foi capaz de restaurar "potes quebrados" para construir representações sobre o passado, mas que propiciou, também, os meios necessários para a articulação de outros discursos (de circulação restrita) destinados a construir identidades alternativas à idéia hegemônica de Nação formulada a partir da capital do Império."

ver mais...

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-47142011000100005&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt