quinta-feira, 19 de abril de 2012

O ÍNDIO MARAJOARA




Meu coração é vermelho, minha alma é preta retinta
o bendito Ossain da casa de Mina teve pena de mim
no dia do Glorioso São Sebastião: seu sangue azul marinho
ano de 1500 era de Cristo, olhai pra isto.

Pisadas do Pinzón até hoje dia do Índio na ilha dos marajós
Marinatambalo chamada, aliás Analau Yohynkaku dos aruã
36 negros da terra Tapuya caçados, peiados, arrastados
a bordo da caravela mundo afora pra nunca mais...

Então a gente foi tirada de dentro da floresta, dos matos
a dente de cachorro e trabuco maluco
por decreto civilizados sob a pele dos cabocos
Diretório dos índios, safado!

Oh, não te lembras da aldeia pequenina, ribeirinha
onde nossa criaturada grande nasceu
era coberta de palhas na ponta da ilha filha da pororoca
lá já havia passado muita gente, cinco mil anos paresque
até a civilização dos tesos jardins suspensos
os começos do mundo pela educação do barro
a Nação mais velha, Yona: sua arte primeva
nós outros, aprendizes Nuaruaques, diz-que...

Que eu sei? Minhas últimas palavras coletadas
entre chuvas e esquecimento ao fim das águas grandes...
Oh bendito Ossain santo orixá da Marujada do Salgado
tenha dó deste imenso Marajó salvo tão só de seu fardo
pelos manos escravos pretos aliviando as nossas penas
verdes, encarnadas e amarelas de malária e fome de justiça:
negra que te quero negra, alma minha rainha
das amazonas guerreiras sem eira nem beira
até o cantar do galo da madrugada para o dia raiar
no parto da manhã...

O grande mal branco do esquecimento foi apagando
a paisagem da memória engolida pela primeira noite
do mundo
cuja jazia dentro de um caroço de tucumã
no fundo do rio: lugar sagrado do reino da Boiúna.

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