quarta-feira, 3 de junho de 2015

Engenheiros do Arari

A Cultura Marajoara - Denise Pahl Schaan (8574582689)



Caro Professor Mangabeira,

Em primeiro lugar, agradeço-lhe por ter tido a coragem cívica de aceitar o desafio de uma arriscada viagem de descobrimento ao Marajó. Digo arriscada, politicamente, devida ao passivo de esperanças ainda não concretizadas desde quando o delegado do rei de Portugal e representante da Cristandade, padre Antonio Vieira, por aqui passou no século XVII. Uma "ilha" fora de série -- entre a Amazônia azul e a Amazônia verde -- que adentra ao continente (microrregião de Portel) depois de reunir 2.500 ilhas que se escondem envergonhadas pelas margens da história aonde só costumam ir marreteiros do pré-capitalismo regional em busca da mais valia do trabalho dos ribeirinhos e caçadores de votos a cada temporada eleitoral. 

Por essas paragens "a Criaturada grande de Dalcídio" (Jurandir) resta invisível desde a expropriação da ilha dos Aruans ou Nheengaíbas, em 1665, para doação da capitania da Ilha Grande de Joanes ao secretário de estado Antonio de Sousa de Macedo, donatário que nunca botou os pés em Melgaço, aliás, aldeia de Aricará; ou outro qualquer lugar do Grão-Pará.

Dessa maneira, o senhor ao contrário do donatário da Ilha Grande de Joanes, pôde ver com seus próprios olhos e ouvir com os seus ouvidos um pouco do muito que esta despossuída gente marajoara tem a dizer ao Brasil e ao mundo caso ela soubesse ler e escrever melhor, noves fora os muitos analfabetos de pai e mãe que já nascem "estrangeiros" em sua própria pátria. 

Com certeza essa sua viagem foi um pequeno grande passo numa estrada de mil léguas na remodelação da Educação nacional: digo isto, pois quem for capaz de colocar Marajó nos trilhos do desenvolvimento humano será capaz de fazer qualquer coisa boa no resto do mundo. Logo mais o senhor compreenderá e saberá a razão pela qual uns poucos militantes ficam animados com a sua presença neste fim de mundo que também é porta de entrada para a maior bacia fluvial da Terra.

Em segundo lugar, em vez de pedir ajuda; gostaria modestamente de oferecer como contribuição ao seu trabalho no Palácio do Planalto estas mal alinhavadas linhas eletrônicas, sempre lembrando o quanto a internet banda larga será importante nestas ilhas com suas 500 e tantas "aldeias" (comunidades) isoladas. Não sou exatamente um homem crente e, bem ao contrário, sou crítico diletante da catequese cristã e do colonialismo (cf. José Varella Pereira, "Novíssima Viagem Filosófica" e "Amazônia Latina e a terra sem mal"). 

Entretanto, se intelectuais e educadores brasileiros pretendem decifrar o enigma amazônico para trazer as luzes da Pátria Educadora aos confins do Brasil deveriam aceitar a sugestão de fazer como o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, nascido na Bahia, na monumental "Viagem Philosophica" (1783-1792) que fez do Marajó o primeiro capítulo da viagem ("Notícia Histórica da Ilha Grande de Joanes ou Marajó", 1783).

O golfão Marajoara de Aziz Ab'Saber ou Amazônia Marajoara de Denise Schaan e Agenor Sarraf, certamente, constitui vestibular para altos estudos amazônicos. Além da SAE na prospectiva de longo prazo, acredito que o IPEA e o MCTI no curto prazo poderiam ser parceiros estratégicos do MEC na aplicação do Pátria Educadora através de atividades de extensão nos campi das universidades públicas atuando no Marajó: inovar é preciso, burocratizar não mais é preciso. A cooperação federativa se ela já é precária entre os dezesseis municípios da mesorregião e secretarias de governo estadual, não parece efetivamente melhor entre repartições federais. Mas, não se pode pedir à Presidência da Republica para instalar um telefone da Controladoria-Geral da União 24 horas a fim de bancar o Big Brother tupiniquim.

Poderia a Universidade de Brasília (UnB) se interessar em compartilhar com a UFPA e outras universidades nacionais e estrangeiras a invenção de uma universidade marajoara para o século XXI? Diria que o primeiro passo deveria ser a Extensão voltada a mobilizar entidades da sociedade civil, igrejas, sindicatos, cooperativas e associações pela erradicação do analfabetismo de adultos. Sabemos do fracasso do Mobral e de como outros países puderam se livrar desta herança da escravidão e da exclusão social: logo, a educação continuada pela base seria esta maneira de colocar em prática uma nova Extensão engajada com a Pátria Educadora.

Espero que este blogue caboco chegue ao tablet ou celular do Ministro após o toró de ideias que a viagem ao Marajó pode lhe ter causado: a rede eletrônica, segundo Pierre Levy, é a inteligência coletiva e o filósofo sebastianista Agostinho Silva diria que é o mesmo que os crentes chamam de Espírito Santo. São diversos Marajós para além de dezesseis municípios que somados fazem um território com o dobro da superfície dos Países-Baixos e tem população equivalente a de um país comparável ao vizinho Suriname, por exemplo. Que Marajó o professor de Havard poderá ter visto, ouvido e recolhido para levar de volta a Brasília? 

Certamente, se ele pudesse permanecer até um ano inteiro em Melgaço poderia saber da geopolítica do recém restaurado reino de Portugal para consolidar a conquista do Amazonas tomado aos holandeses e ingleses graças a rixa entre índios Tupinambás e Nheengaíbas (Nuaruaques ou Marajós). As aldeias de Aricará (Melgaço) e Aracaru (Portel) estão implicadas nas pazes de Mapuá (Breves)... Em meio à névoa barroca da utopia evangelizadora de Antônio Vieira (carta de 11/02/1660 a El-rei de Portugal Afonso VI, "História do Futuro" e "O reino de Jesus Cristo consumado da terra") escapa alguma coisa reveladora, por acaso, das preocupações do atual pontificado do papa Francisco: a paz universal sonhada -- quem diria -- há mais de três séculos na Amazônia lusitana e agora brasileira. Que completará 400 anos em 2016...

Todos nós, nativos ou não, não somos mais que videntes e ouvintes de uma longa história escrita no barro dos começos do mundo. Sabemos, graças ao progresso da Ciência, que nossos antepassados vieram todos do coração da mãe África há milhares de anos para descobrir o mundo e hoje somos bilhões de seres humanos a bordo de um planeta em profunda crise civilizacional.



QUE OS ENGENHEIROS DO ARARI TEM A VER?



Os engenheiros do Arari foram aqueles e aquelas que, há quase dois mil anos, saíram dos cinco mil anos de nomadismo amazônico atrás de piracemas na pesca de gapuia (captura de peixes e coleta de mariscos à mão) e, por necessidade e acaso, acabaram inventando a primeira aldeia suspensa na ilha do Marajó que levou à Cultura Marajoara. Do mesmo modo, em 1972, o padre Giovanni Gallo com seus colaboradores leigos inventaram o sui generis MUSEU DO MARAJÓ...

O museu do Gallo foi feito para as pessoas "ver com as pontas dos dedos" (explicação nos livros escritos pelo mesmo). Já, Rosemiro Pamplona e seus roqueiros cabocos fizeram paródia da banda "Engenheiros do Havaí", são músicos do Extremo Sul... Isto me lembra do Extremo Norte, ciclo romanesco de Dalcídio Jurandir, que foi ao Rio Grande do Sul escrever o primeiro romance proletário brasileiro, "Linha do Parque"... E o Havaí é a terra natal de Barak Obama, Mangabeira Unger foi mestre de Obama em Havard... Os Mestres da Guitarrada cantam o Caribe no Pará: e os antigos marajoaras vieram de lá.

Misturando minha lucidez com a minha maluquez, dá vontade de dizer tudo isto e muito mais, cantando. A linguagem mais perto do coração da gente.




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REGISTRO DA ARTE MARAJOARA NO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL BRASILEIRO

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