quinta-feira, 31 de março de 2011

INICIATIVA MARAJOARA

Como resultado preliminar de nossas tentativas em estabelecer contato com autoridades do 'GM16' (grupo de municípios marajoaras), do Estado e da União responsáveis pela Cultura a fim de chamar atenção para a questão da Cultura Marajoara, a Ouvidoria do Ministério acusou recebimento de email e o MPF-PA tomou nota e acompanha andamento do assunto.

Ademais, com a prestimosa colaboração do companheiro José Maria Reis, coordenador de relações internacionais da ong Argonautas; tivemos uma primeira reunião no Escritório Norte do Ministério da Cultura, em Belém-PA,para nivelamento de informações a respeito da competência do referido escritório e as demandas de Marajó na área da cultura.
 
Acho todavia que chegamos a uma fase que exige resultados e assim, doravante, deve-se ultrapassar a fase anterior de atitudes individuais isoladas ou parciais para construirmos juntos uma INICIATIVA SOLIDÁRIA de modo a congregar o maior número possível de interessados na solução dos problemas que afligem a gente marajoara além dos puros aspectos da Cultura (notadamente nos termos constantes do Art. 13, VI, §2º da Constituição do Estado do Pará, que trata da área de proteção ambiental remetendo-a, corretamente, ao quadro geral do desenvolvimento socioeconômico).
 
Como todos sabemos, por necessidade e acaso,a obra literária engajada de Dalcídio Jurandir (Ponta de Pedras,1909 - Rio de Janeiro,1979) e a antropologia pragmática de Giovanni Gallo (Turim,1927 - Belém, 2003) são, como os cabocos dizemos, "unha e carne" (inseparáveis); tendo por traço comum a dita cuja gente marajoara... Ora, pesquisadores apontam o romance dalcidiano como fonte para antropologia das regiões amazônicas. "Marajó" é visto pela crítica como "o primeiro romance sociológico brasileiro" (Vicente Salles) e "Linha do Parque" com temática do Rio Grande do Sul considerado "o primeiro romance proletário, digno deste nome no Brasil" (Carlos Peres, dissertação).

Pois bem, o MUSEU DO MARAJÓ www.museudomarajo.com.br é a materialidade da cultura marajoara remanescente do índio, do negro escravo e do branco degredado nas condições geoculturais do isolamento no novo Trópico Úmido. Não foi àtoa que a correspondência entre Maria de Belém Menezes e Dalcídio Jurandir estabeleceu conexão entre o padre jesuíta refratário à hierarquia eclesial (vide livro-reportagem "Marajó, a ditadura da água" e autobiografia "O homem que implodiu", de G. Gallo)e o militante comunista agnóstico.

Se há uma causa comum para esta heterodoxia incomum pode-se dizer, sem dúvida, que ela é a indefectível "criaturada grande de Dalcídio". Ou seja, a dita gente... [ver www.dalcidiojurandir.com.br ]. Mas, fazia falta uma fundamentação histórica e científica específica, de modo a recuperar "o barro dos princípios do mundo" (saudação de Jorge Amado a Dalcídio, o "índio sutil"...)e promover o 'aggiornamento' da antiga CULTURA MARAJOARA ao mundo dos cabocos ribeirinhos das ilhas do Pará-Amazonas.

Este recurso, como o nativo do Marajó foi ao Extremo-Sul reportar a luta dos trabalhadores gaúchos contra a vil exploração humana na alienação do Trabalho;como a Cabanagem se fez irmã da Farroupilha; veio em forma de gente e inteligência devassar os arcanos mais profundos da "primeira cultura complexa da Amazônia". Trata-se do memorável trabalho de pesquisa arqueológica realizada pela gaúcha Denise Schaan www.marajoara.com , prefaciadora da obra "Motivos Ornamentais da Cerâmica Marajoara" (G.Gallo) e autora da obra-libelo "Cultura Marajoara", ed. SENAC-SP, 2010.

A primeira notícia da cerâmica marajoara está na separata da "Viagem Philosophica", com título de "Notícia Histórica da Ilha Grande de Joanes, ou Marajó" (1783), de Alexandre Rodrigue Ferreira. Informa que Florentino da Silveira Frade, fundador da vila de Cachoeira (1744)encontrou o primeiro sítio arqueológico da ilha do Marajó que se teve informação, no dia 20 DE NOVEMBRO DE 1756 (data que, a exemplo do Dia Nacional da Consciência Negra; também se deveria tomar consciência daquela PRIMEIRA CULTURA COMPLEXA DA AMAZÔNIA...

Ora, não sejamos inocentes! A Política Nacional de Cultura não cura estas impertinências marajoaras não é por falta de informação!!!

TRATA-SE SIM DE UMA ANTIGA E CONTINUADA DISCRIMINAÇÃO DE MATRIZ COLONIAL, que se acha à raiz da queda de braço entre o Museu Nacional e o IPHAN no bojo da revolução de 1930... Este,bem claro, a favor da preservação da pedra colonial e aquele em favor da recuperação da memória do barro dos começos do mundo-Brasil...

é tempo de rever o peso de todas estas coisas!!! Não se trata de cuidar de um patrimônio e desvalorizar o outro, mas sim de cuidar de um único e só PATRIMÔNIO CULTURAL DO BRASIL e abolir a crença de tudo começou com Cabral, em Porto Seguro, em 1500...

"quem há de gabar a lagoa se não o sapo?" (ditado popular). Quem há de "se doer" pelo Marajó mais do que os próprios marajoaras e os amigos do Marajó?

o Ministério da Cultura possui em Belém-PA o Escritório Regional Norte (MINC NORTE) instância ministerial onde poderemos depositar e coordenar nossas queixas, reclamações e sugestões. Mas, sobretudo, estabelecer relação de parceria no espírito de integração federativa que norteia ou deveria nortear o PLANO AMAZÔNIA SUSTENTÁVEL (do qual, pelo menos em tese, pende o piloto "Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável do Arquipélago do Marajó" (PLANO MARAJÓ) e programa Territórios da Cidadania - Marajó).
 
Esta, para nós, deveria ser uma questão de ordem! Pois aí - apesar das imperfeições, contradições e mal entendidos - temos, pela primeira vez em séculos de arbítrio, uma regulação democrática participativa que deveria ser o principal instruumento para a mudança de mentalidade tecnoburocrática que infelicita a população de uma das regiões ecoculturais do Brasil mais cantada em prosa e verso - com testemunho do conjunto da obra literária, o Ciclo Extremo-Norte de Dalcídio Jurandir; primeiro ganhador do Prêmio Machado de Assis (1972) por escritor da Amazônia.
 
José Varella Pereira
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário