domingo, 12 de fevereiro de 2012

DA TERRA SEM MALES AO INFERNO VERDE...

Sem saber nadinha, nossa querida e mal conhecida Amazônia Marajoara foi palco, há pouco mais de três séculos e meio, duma história incrível: o casamento do messianismo judeu-cristão, via Portugal sebastianista, com a utopia selvagem da Terra sem males no rio das Amazonas...  Tudo começou, sob bandeira da União Ibérica, no ano de 1623, com a expulsão dos holandeses do rio Xingu e tomada de Mariocai dando lugar ao forte português de Santo Antônio de Gurupá: a completar 390 anos em 2013. 

O engraçado desta inverossímil história paraense é que os historiadores, sem conhecer um palmo diante do nariz sobre a religião dos Tupinambás [apud Florestan Fernandes], se precipitaram a louvar Santo Antônio, que por obra dos frades do convento do Una, havia supostamente arrebanhado os arredios e escarmentados índios do Tocantins para tomar armas e lutar como mil demônios contra os holandeses e seus pacatos parceiros indígenas, logo convertidos em "ferozes" falantes da "língua ruim"... Começa aí a teoria do milagre e, em realidade, a invencível resistência marajoara somente dobrada pela missão de paz, começada pelo padre João de Souto Maior em 1656 e concluída com êxito, parcial, pelo padre Antônio Vieira, em Mapuá (Breves), em 27 de agosto de 1659. Fato que levou, imediatamente, à fundação da aldeia Aricará (Melgaço) e de Arucaru (Portel) com índios "nheengaíbas" transferidos da margem esquerda para a direita do rio Parauaú. Vieira é prolixo para supervalorizar o feito missionários e detalhista ao retratar a paisagem de igapós dos Furos de Breves, mas avaro em registrar o nome de seus interlocutores. Convenhamos que por prudência diante de seus inimigos que não eram poucos de um lado e outro do Atlântico... De modo que só ficamos com o nome incerto de Piié, cacique dos Mapuá, dentre os sete chefes Nheengaíbas, dois índios escravos do convento de Santo Alexandre que serviram de portadores da "carta-patente" e foram, todavia, os verdadeiros diplomatas negociando mato adentro com seus famigerados parentes. Fora os padres, remadores tupinambás de soldados "portugueses" [mamelucos]da praça de Cametá: está visto que o Tocantins verdadeiramente foi a ponta de lança desta conquista e travessia das Ilhas para dentro do vale do rio Amazonas... Desde algum tempo antes dos europeus (cf. relato de Diogo Nunes, in Nelson Papavero et al. "O novo Éden").

Mas, antes que a gente se perca no mato sem cachorro e a vaca fria vá para o brejo, convém nos advertir logo tomando emprestado o famoso rompante do imperador pro tempore Bill Clinton: "é a economia estúpido!". Sim, o motor desta e outras histórias de conquista e conversão de corações e mentes que ficam para semente da História mundial foi e continua sendo a incontornável economia: no caso a cobiça das minas do Peru além Solimões: por acaso, onde um acordo criativo entre biólogos e cabocos de várzea, inventou a primeira reserva de desenvolvimento sustentável do planeta, a RDS Mamirauá, no estado do Amazonas.


Significa dizer, no fim da história das Amazonas, nem ouro dos Incas nem Terra sem males, mas o apelidado "desenvolvimento sustentável". O que nos salva a todos abaixo do equador, justos e pecadores, são as almas puras como o beato José de Anchieta e seu astuto camarada cacique Tibiriçá, fundadores do colégio São Paulo de Piratininga, sócios do negócio da conversão da antropofagia mágica pelo rito eucarístico da manducação do sagrado coração de Jesus. 

Política econômica do câmbio da guerra antropofágica de conquista de Terra sem males pela luta de classes mitigada através do catecismo pela metafísica da salvação das almas do limbo ou purgatório em busca do Céu sob terror do Inferno eterno.

Refiro-me in sito ao relato inverossímil e magnífico ao mesmo tempo do payaçu Antônio Vieira sobre a impossível pacificação dos bárbaros Nheengaíbas [marajoaras], em 1659, prodígio creditado a uma carta-patente com sinete da Companhia de Jesus expedida pelo supracitado padres a sete caciques pagãos (por suposto analfabetos) de que trata carta à regente do reino de Portugal dona Luísa de Gusmão. Ato inaugural do realismo-mágico amazônico, avant la lettre e malgré a utopia evangelizadora do autor da carta "As esperanças de Portugal", escrita em Cametá-PA em abril daquele mesmo ano ao bispo do Japão, prenhe de sebastianismo notavelmente inspirado no texto "As esperanças de Israel" do rabino português de Amsterdã Menassés ben Israel, nascido e batizado na ilha da Madeira como Manoel Dias Soeiro. A Madeira, como se sabe, é um destes lugares invisíveis onde as coisas acontecem de fato em segredo e à margem da História, servindo de capa a acontecimentos prodigiosos como, por exemplo, a célebre escola de Sagres. Tal qual, em Gurupá-PA, Santo Antônio levou a fama mas o milagre foi do diabolizado Jurupari...

Escrever livros do futuro e cartas explosivas da linha do tempo, com esmero de estilo, foi a marca pessoal do padre grande e motivo pelo qual o "imperador da língua portuguesa" coroado pelo poeta Fernando Pessoa, nascido em Lisboa, educado e falecido na Bahia; acabou condenado pela Inquisição sob acusação de professar heresia judaizante. 

Durante a missão amazônica de Vieira, nada se compara em sua obra à Lei de abolição dos cativeiros indígenas (1755), a celebração da paz com os povos nheengaíbas da ilha do Marajó e o bombástico anúncio do Quinto Império do mundo - "Bandarra é verdadeiro profeta!" -, no remarcável ano de 1659. Sem dizer que o profeta sebastiano, tedioso estudioso do Apocalipse; estava crente de que o mundo iria se acabar fatalmente em 1666.

Era o reino cristão português sucursal de interesses da Diáspora judaica estabelecida em cidades-estados da península itálica em concorrência aberta com reinos árabes dominadores da rota de especiarias das Índias? As Cruzadas foram uma guerra mundial cujos efeitos ainda não cessaram de causar conflitos até hoje.

É claro que a conquista do rio Babel ou das Amazonas decorreu ainda no rescaldo daquela crise do velho continente. E se a "criaturada grande de Dalcídio" [populações tradicionais] nas ilhas do Marajó não fossem analfabetas; quase a metade em meio milhão de habitantes, e a escola fosse formada para ensinar a verdadeira história da gente marajoara, o Brasil e o resto do mundo saberiam disto mil vezes mais e ainda melhor do que o inconveniente caboco que vos fala.


O fato, sem nenhuma dúvida, dissipadas as brumas da fantasia barroca e a famosa lábia do padre-diplomata é que onde a história claudica a geografia do lugar depõe a favor dos acontecimentos que a ilustrada intelligentsia brasílica, por preguiça mental ou preconceito, joga para o último plano da formação territorial da Feliz Lusitânia, finalmente convertida em Amazônia brasileira e defendida, quase por milagre, da cobiça estrangeira por arcos e remos tupinambás. Porém, sem a ruptura da linha do "testamento de Adão" [tratado de Tordesilhas, 1494]não existiria este arremedo de interpretação historiográfica nem adesão do Pará à independência do Brasil... E o nome deste limite geopolítico era Costa-Fronteira do Pará: por acaso, "barreira do mar" das ilhas do Marajó. Ou, mais precisamente, a nuvem de setas envenenadas de curare lançadas de mortais zarabatanas que deram renome ao "homem malvado", o Marajó velho de guerra, matador de invasores...


Aqui a historiografia colonial nos deixa num beco sem saída: o bravo "bon sauvage" dos filósofos da revolução francesa seria um estúpido cavalo de batalha montados por rudes soldados lusitanos movidos pela lenda do ouro das amazonas e o mito de Dom Sebastião ou, na verdade, a história é outra bem diferente e os idiotas acabamos sendo nós que desprezamos o mito nativo fecundo pelo prato de lentilhas de uma lorota colonizadora de quinta categoria...

POR UM LONGO PERCURSO ATRAVÉS DO TEMPO E DO ESPAÇO, DESDE O PARAGUAI PASSANDO PELO SUDESTE E NORDESTE DO BRASIL ATÉ O ALTO AMAZONAS; O MITO DA TERRA SEM MAL INVENTOU A AMAZÔNIA: CORAÇÃO PULSANTE DA AMÉRICA DO SOL.

Obra da necessidade com o acaso ou a divina providência; a gente não sabe dizer. Só sei que foi assim... O certo é que aquilo que era para ser o paraíso encontrado na terra dos tapuias ou talvez a primeira fronteira do reino de Jesus Cristo consumado no quinto império do mundo, demarcando o antes e o depois da história do futuro; converteu-se no passo em falso por onde o inferno verde veio a furo.

Que nem na velha Grecia sofista, eu e meus compadres cabocos saídos do mato a dentes de cachorro sob fogo de arcabuz para os cuidados espirituais e operários da missão catequética; somos os derradeiros praticantes de uma escola diletante, dita localmente "os retóricos"...; que está para a filosofia bem pensante como a música brega está para a fina estampa da música erudita. Para esta gente ribeirinha, a formosa idade que o profeta prometeu [Isaías, 11:7 - "A vaca e a ursa pastarão juntas, seus filhos se deitarão juntos, e o leão comerá palha como o boi."]é tão verdade ou mentira como o caraíba pregar sobre uma terra da promissão dos pajés-açus onde as flechas vão ao mato sozinhas e voltam que nem bumerangue trazendo a caça... Terra mágica onde não existe fome, trabalho escravo, doença, velhice e morte...


Que utopia é esta impossível de materializar no espaço plano de Euclides? Será que não valeria a pena "procurá-la", pouco a pouco, no espaço curvo de Einstein através duma C&T impulsionada pela a esperança duma Terra sem males nenhum e para todo mundo? As tribos perdidas do cativeiro da Babilônia e as tribos extintas de todas as Índias misturando as suas mágoas e as suas esperanças ainda seria talvez capazes de inventar novos mundos sem fim. O nome desta nova utopia, simplesmente, seria Paz. Mas, enquanto houver um só homem ou mulher passando fome, forçado a trabalhar, doente e temendo a velhice e a morte; haverá também neste mundo esperança e luta.




DONDE SAIU A UTOPIA SUL-AMERICANA?

El Origen del Mundo en la Cosmovisión Mbya Guaraní.

Ñamandú, dios supremo de la creación se creó a sí mismo en medio del caos y las tinieblas. Iluminado por su propio corazón, ya que el sol no existía, se irguió desde los pies y convirtió sus brazos y manos en ramas que agitaba el viento.

Una corona de flores rodeó su cabeza mientras revoloteaba el colibrí, el pájaro primero.

Después creó la palabra (ayvú) -lo que confiere a los guaraníes su condición de elegidos y destinados a la inmortalidad-, entendida como la expresión de la humanidad como colectividad solidaria, no como ser individual.


De sus palabras surgieron luego los dioses, padres de los hombres: Jakairá, Karaí, Tupá y Ñamandú Py’a Guasú.
Luego desplegó la tierra y la bóveda celeste a la que sostuvo con cuatro palmeras pindó azul, al Este, Al Oeste, al Norte y al Sur, y agregó otra en el centro.

Una vez concluida esta parte, surge el mundo subterráneo, el terráqueo y el acuático, así como el día y la noche.

Más tarde entregó a cada dios creado de su palabra una facultad sobre las cosas: dio a Tupá el agua y lo fresco, a Karaí el fuego y el calor, a Jakairá la niebla y el humo, a Ñamandú Py’a Guasú el coraje.

Al fin y al ver que ya estaban dadas las condiciones materiales creó a los seres humanos con parte de la niebla y ordenó a Karaí que les pusiera algo de fuego en el corazón y a Tupá que les cediera un poco de frescura.

Luego, les dio a los hombres sus leyes para que las aprendieran y las cumplieran.
Cumplida su tarea, se retiró a descansar.


Basado en el libro:
Ayvy Rapyta—León Cadogan


Adaptación escolar realizada por:
  • Virgilio Oscar Benitez (Karai Henchyroã)-Maestro de Lengua y Cultura Guaraní Escuela Intercultural Bilingüe Nº 807 F.Mbororé.
  • José Javier Rodas-Docente Especialista en Alfabetización Intercultural Escuela Intercultural Bilingüe Nº 807 F.Mbororé.

Autores de la adaptación del texto y alumnos de la Escuela F.Mbororé
FONTE: http://cronicasinmal.blogspot.com/search/label/Origen%20del%20Mundo%20-%20Cosmovisi%C3%B3n%20Mbya%20Guaran%C3%AD

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