vista aérea do lago Arari, berço da Cultura Marajoara de 1600 anos de idade.
O Ministério do Meio Ambiente vai financiar
um projeto de perenização do Lago Arari, considerado o maior santuário
ecológico do Marajó e um dos maiores de água doce no mundo - abrange os
municípios de Cachoeira, Santa Cruz do Arari e Ponta de Pedras, numa área de quase
100 quilômetros de extensão.
Essa região possuía mais de 150 lagos, que
foram secando e reduzindo as condições de sobrevivência da população.
Fonte: Reporter70.
Comunicação/AMAM
Sobre a perenização do lago Arari já correu rios de tinta. A notícia mais recente na mídia local, concisa porém festiva como de costume; diz que o Ministério do Meio Ambiente vai financiar projeto para tornar o lago Arari perene: quer dizer, um reservatório de água e de vida durante o ano inteiro. Não se deve regatear aplausos, todavia a experiência recomenda ter a prudência de São Tomé pois se sabe que cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, mormente em época de eleição e propaganda partidária.
Oxalá a pequena notícia de jornal venha ser um pequeno grande passo para o futuro de Povo Marajoara marginalizado pela história de invenção da Amazônia. Como para o meio ambiente a Amazônia é o futuro do Brasil sustentável, só podemos nos regozijar desta esperança tão antiga.
Já o Barão de Marajó em sua obra clássica "As Regiões Amazônicas", em fins do século XIX, revelava preocupação com o regime hídrico da grande ilha do golfão marajoara sempre oscilando entre o dilúvio e secas certeiras no decorrer do ano. Os impactos sociais e ambientais previsíveis não comoveram governos após governos como bem atestam as obras de Dalcídio Jurandir e de Giovanni Gallo.
Nos anos 70 a Organização de Estados Americanos (OEA) deu ajuda ao Governo do Estado do Pará no estudo da ilha do Marajó que, certamente, ainda é base para aprofundamento de novos estudos atualizados, inclusive no que diz respeito a qualquer projeto de perenização de lagos e revitalização de rios. Fundamental, para o público leigo é compreender o fato principal da geologia do delta-estuário do maior rio do mundo onde se acha o maior arquipélago fluviomarinho do planeta. Isto a grande mídia não sabe. Portanto, só se ama o que se conhece...
Neste bioma extraordinário e complexo o lago Arari é como se fosse o coração pulsante, onde o Homem e a Biosfera interagem sem solução de continuidade. Daí por que a chegada do Ministério do Meio Ambiente deve ser comemorada com moderação, no sentido de não se reincidir na miopia que o mesmo Padre grande Antônio Vieira, autor do célebre "Sermão aos Peixes", ao elogiar o peixinho tralhoto dotado de quatro olhos para se defender dos predadores; cometeu em relação à gente reduzindo seus saberes milenares às lições do catecismo para conversão à santa doutrina cristã. Deu no que deu... E o IDH do povo marajoara não nos deixa mentir sobre a história do paraíso ecológico.
Com isto, quero chamar atenção para os chamados EIA-RIMA's à voo de pássaro... Vistas muito aéreas da realidade sob pressão de cronogramas orçamentários e metodologia cartesiana. Com advertência da linguística quando esta diz que o mapa não é o território...
É preciso perder tempo nos primeiros passos para ouvir o que o povo tem a dizer aos donos do poder. Ler, com paciência, autores leigos ou antigos como o mesmo Barão do Marajó, o sábio Alexandre Rodrigues Ferreira, Giovanni Gallo, sobretudo, em "Marajó, a ditadura da água".
Devemos saber que o orgulho técnico e civilizado nestas paragens deixou um "carma" dos diabos... Os mesmo missionários pacificadores lesaram a ancestralidade da gente marajoara tornando-a presa fácil dos "diretores dos índios" patriarcas das nossas dez e seis comunas. Lembrai-vos do Diretório dos Índios (1757-1798), donde nossas aldeias históricas foram "elevadas" da noite para o dia em vilas e lugares importadas de Portugal...
Perenizar as águas do lago não deve ser, exatamente, refazer um "santuário ecológico" que só existiu na imaginação de poetas e sonhadores da mítica Terra sem Mal, mas nunca existiu na dura realidade da vida dos povos originais do Trópico Úmido. Olhar o passado para inventar o futuro é mais seguro...
Um projeto de perenização que não se acanhe, pela vaidade nacional, em pedir consultoria de quem mais entende de hidrologia nas terras baixas do mundo, a Holanda, por exemplo. A reserva da biosfera nos traria o programa da UNESCO, "O Homem e a Biosfera" - MaB. Com a experiência de Mamirauá, no Amazonas; o MMA pode contemplar o lago Arari de uma RDS compatível. Se, de saída, algum especialista começar dizendo isto pode aquilo não pode; deve logo ser advertido a se informar melhor do invento de José Márcio Ayres e seus colegas macaqueiros.
Tudo pode quando Ciência e Conhecimento Tradicional concordam.
ECOCIVILIZAÇÃO AMAZÔNICA SERÁ REFAZENDA DA CULTURA MARAJOARA DESDE SUA INVENÇÃO HÁ 1500 ANOS OU NÃO SERÁ ECOCIVILIZAÇÃO.
"... Na grande boca do Rio das Amazonas está atravessada uma ilha de maior comprimento e largueza que todo o Reino de Portugal, e habitada de muitas nações de índios, que, por serem de línguas diferentes e dificultosas, são chamados geralmente nheengaíbas. Ao princípio receberam estas nações aos nossos conquistadores em boa amizade; mas depois que a larga experiência lhes foi mostrando que o nome de falsa paz, com que entravam, se convertia em declarado cativeiro, tomaram as armas em defensa da liberdade, e começaram a fazer guerra aos portugueses em toda à parte. Usa esta gente canoas ligeiras e bem armadas, com as quais não só impediam e infestavam as entradas, que nesta terra são todas por água, em que roubaram e mataram muitos portugueses, mas chegavam a assaltar os índios cristãos em suas aldeias, ainda naquelas que estavam mais vizinhas às nossas fortalezas, matando e cativando; e até os mesmos portugueses não estavam seguros dos nheengaíbas dentro de suas próprias casas e fazendas, de que se vêem ainda hoje muitas despovoadas e desertas, vivendo os moradores destas capitanias dentro em certos limites, como sitiados sem lograr as comodidades do mar, da terra e dos rios, nem ainda a passagem deles, senão debaixo das armas. Por muitas vezes quiseram os governadores passados, e ultimamente André Vidal de Negreiros, tirar este embaraço tão custoso ao Estado, empenhando na empresa todas as forças dele, assim de índios como de portugueses, com os cabos mais antigos e experimentados; mas nunca desta guerra se trouxe outro efeito mais que o repetido desengano de que as nações nheengaíbas eram inconquistáveis, pela ousadia, pela cautela, pela astúcia e pela constância de gente, e, mais que tudo, pelo sítio inexpugnável com que os defendeu e fortificou a mesma natureza. É a ilha toda composta de um confuso e intrincado labirinto de rios e bosques espessos, aqueles com infinitas entradas e saídas, estes sem entrada nem saída alguma, onde não é possível cercar, nem achar, nem seguir, nem ainda ver ao inimigo, estando ele no mesmo tempo debaixo da trincheira das árvores, apontando e empregando as suas flechas. E por que este modo de guerra volante e invisível não tivesse o estorvo natural da casa, mulheres e filhos, a primeira coisa que fizeram os nheengabas, tanto que se resolveram à guerra com os portugueses, foi desfazer e como desatar as povoações em que viviam, dividindo as casas pela terra dentro a grandes distâncias, para que em qualquer perigo pudesse uma avisar às outras, e nunca ser acometidos juntos. Desta sorte ficaram habitando toda a ilha sem habitarem nenhuma parte dela, servindo-lhes porém em todas os bosques de muro, os rios de fosso, as casas de atalaia, e cada nheengaíbade sentinela, e as suas trombetas de rebate...." (carta do Padre Antônio Vieira, à Regente da coroa portuguesa, Dona Luísa de Gusmão, em 11/02/1660).
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"Excelente a reportagem do padre [Giovanni Gallo] sobre os mestres de
ofício. Tenho uma grande admiração por esses mestres que desafiam a
tecnologia sofisticada". (Dalcídio Jurandir / correspondência com Maria de Belém Menezes).
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